05/09/2017

A masculinização das Forças Armadas

Soldado beija o marido ao chegar da guerra. Imagem: Reprodução Facebook

    As Forças Armadas são entendidas como um espaço reservado somente aos homens heterossexuais que se encaixam no padrão masculino do sistema heteronormativo. Entretanto, nem sempre foi assim, uma vez que grandes líderes políticos e militares do passado sentiam atrações por pessoas do mesmo sexo. Além disso, a formação da identidade homossexual, assim como a heterossexual, é uma construção social.
     A Marinha, o Exército e a Aeronáutica, bem como o universo bélico de uma forma geral são entendidos como elementos pertencentes do machismo. Quando o homem é uma criança, lhes é dado brinquedos de pistola (não necessariamente uma mini-pistola, mas aquelas de brinquedo que jorram água por exemplo), bonecos que costumam se envolver nas mais diversas guerras e video-games onde algumas tarefas consistem em lutar nas mais diversas situações, seja em uma guerra ou em uma luta corporal. Atores como Jean-Claude Van Damme, Sylvester Stallone e Arnold Schwarzenegger, que possuem no currículo dezenas de filmes de ação (que por sinal contém cenas épicas de luta), costumam ser os ídolos destes mesmos rapazes. Esta é uma das razões que fazem com que muitos meninos sonhem com as Forças Armadas.
      Os LGBTs não são tolerados nas Forças Armadas. Os mesmos sofrem todo tipo de violência e humilhações, que incluem agressões físicas, verbais, "piadinhas", punições sem motivo aparente e até estupro. Os LGBTs que desejam ingressar nas Forças Armadas são desestimulados a seguir tal carreira. E quando não são desestimulados a fazer tal coisa, lhes são recomendados a não "dar pinta" e "engrossar" a voz para não sofrerem nenhuma forma de violência. As Forças Armadas são um dos redutos do machismo.

Alexandre (Colin Farrell, à esquerda) e Heféstion (Jared Leto, à direita) em cena do filme Alexandre (2004). Imagem: Reprodução. 

     Se atualmente a presença de LGBTs nas Forças Armadas não é tolerada, saiba que nem sempre foi assim. O conquistador Alexandre, o Grande (356-323 a.C.), que deixou seu legado na história e até hoje é lembrado por isso, costumava se envolver com pessoas do mesmo sexo que o seu. Seu amante era Heféstion, seu braço direito e ocupante de um importante posto no Exército. Quando o amado morreu, Alexandre ficou sem comer e beber por dias. Ordenou que um funeral majestoso fosse preparado. Os preparativos eram tantos que o mesmo só pôde ser realizado seis meses depois da morte de Heféstion. Alexandre fez questão de dirigir a carruagem fúnebre, decretando luto oficial em seu reino. O romano Suetônio (69-130 d.C.) escreveu em seu livro As Vidas dos Doze Césares (datado do século II) sobre os hábitos dos governantes do fim da república e do começo do Império Romano. Dos doze, só um deles, Cláudio, nunca teve relações com outros homens. O mais famoso, Júlio César (100-44 a.C.), teve aos 19 anos um relacionamento com o rei Nicomedes. É de extrema importância ressaltar que no tempo em que Júlio César e Alexandre, o Grande viveram não existia a "cultura LGBT" como existe hoje. Eles apenas gostavam de se relacionar com outros homens. Ponto. Não havia gosto musical, modos de vestir, falar, andar e hábitos culturais de maneira geral que classificam os LGBTs, como acontece hoje. Até porque o termo LGBT só surgiria MUITO tempo depois, nos anos 1990 d.C.
     Entretanto, parece que com o tempo houve uma retrocesso. Como já dito neste texto, militares do sexo masculino que se envolvem com outros homens são vítimas de todo tipo de violência, como por exemplo: violência física, verbal, "piadas e brincadeiras", punições sem motivo aparente e estupros. Este é um assunto que volta e meia vem a tona, onde militares assumidamente LGBTs falam sobre o assunto. Talvez o caso mais recente é o de Talles de Oliveira Faria, que em dezembro de 2016 foi à formatura do curso de Engenharia do Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA) usando vestido, salto alto, maquiagem e cabelo descolorido. O jovem fez isso em sinal de protesto contra a homofobia latente na instituição. O caso teve grande repercussão e reacendeu a discussão sobre a LGBTfobia nas Forças Armadas. Em resposta ao ocorrido, o ITA disse que não questiona a orientação sexual de seus estudantes e formandos. Entretanto, Talles escreveu em sua página pessoal no Facebook expressões que ouviu dentro da instituição que provam que a mesma é homofóbica. Veja aqui.


A quantidade de mulheres que escolhem ingressar nas Forças Armadas tem aumentado bastante nos últimos tempos. Imagem: Reprodução. 

     Alguns militares usam como argumento para proibir a presença de LGBTs nas Forças Armadas o fato de o homossexual ser descontraído, efeminado e espalhafatoso, sendo brincalhão na maior parte do tempo. Isso porque, para ser militar, é preciso ser discreto, sério e enérgico. Vamos por partes. Não se pode encaixar os homossexuais em uma mesma categoria porque existem homossexuais e homossexuais. Da mesma forma que existem gays espalhafatosos e efeminados, existem também gays discretos e masculinizados. Independente de serem efeminados ou não, um homossexual sabe muito bem como se comportar em cada ocasião. Se ele puder ser brincalhão, vai ser brincalhão e se a situação exige seriedade, ele vai agir com seriedade. Além disso, quando dizem que um gay militar não vai ser respeitado pelo fato dele ser efeminado, é reforçada a misoginia, que demoniza tudo aquilo que é referente ao universo feminino, seja a voz da mulher, o modo como ela anda e como se comporta por exemplo. E é esta mesma misoginia que é uma das razões para a mulher não atingir posições muito altas nas Forças Armadas. Aqueles que dizem que um homossexual não deve ingressar nas Forças Armadas pelo fato de o mesmo ser escandaloso e efeminado escondem por trás deste argumento a homofobia e a misoginia que carregam dentro de si.
      É importante destacar que, apesar do preconceito, muitos homossexuais conseguem seguir carreira nas Forças Armadas, chegando até a viver livremente a sua sexualidade. Alguns até conseguem se casar, fardado e tudo! Este debate é antigo e a maioria dos países ocidentais, em especial aqueles que são membros da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), revogaram leis que excluíam das Forças Armadas membros de minorias sexuais. No Brasil, os membros LGBTs não são excluídos das Forças Armadas, mas denúncias de LGBTfobia dentro das mesmas não são raras.

Em fevereiro de 2016, uma foto do casamento dos militares norte-americanos Shane Adriano e Tristian Resz, foi publicada nas redes sociais e teve repercussão mundial. Imagem: Reprodução Facebook.

Conclusão

      A masculinização das Forças Armadas foi algo que aconteceu ao longo do tempo, uma vez que nem sempre foi assim. Por incrível que pareça, houve uma época em que se envolver com pessoas do mesmo sexo era algo normal e isso não era empecilho para alguém seguir uma carreira militar. De lá para cá houve um enorme retrocesso. 

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