27/09/2018

Entrevista com Renato Drummond Tapioca Neto

Renato, o entrevistado do mês de setembro do blog A Hora. Imagem: Martharluam Silva. 

     O mês de setembro chega ao fim e, como acontece todo mês no blog, eu publico aqui uma entrevista. O entrevistado do mês de setembro é Renato Drummond Tapioca Neto. Renato é licenciado em História pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) (2014) e mestre em Memória: Linguagem e Sociedade pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) (2017). É o autor do blog Rainhas Trágicas e do livro Rainhas Trágicas: quinze mulheres que moldaram o destino da Europa (2016), publicado em Portugal. Atualmente, é professor de História no Colégio Estadual Lauro Farani Pedreira de Freitas (Iaçu - Bahia) e professor visitante na Escola de 1º Grau Pererê (EPGP).
     Dia 07 de setembro é o dia em que o Brasil se torna independente de Portugal, deixando de ser colônia  e se tornando um império. Por conta disso, convidei Renato para uma entrevista aqui a fim de falarmos sobre o período imperial brasileiro e também sobre algumas rainhas que deixaram seu nome na história. Confira:


1 - A Hora: Eu sempre começo minhas entrevistas perguntando sobre a infância do entrevistado. Me fale um pouco como foi a sua.

Renato Drummond Tapioca Neto: Para muitos, a infância se constitui numa das fases mais douradas da vida. Comigo não foi diferente. As crianças costumam observar o mundo através das lentes da fantasia e, assim, conseguem suportar melhor momentos difíceis. Meus pais se separaram quando eu tinha cinco anos de idade e minha mãe trabalhava em tempo integral para dar uma boa educação aos filhos. Desde então, fui criado por ela, minha avó e tia. Acredito que tenha sido por isso que eu me tornei um apaixonado pela história das mulheres, pois cresci cercado por mulheres fortes e independentes, que me ensinaram a ter respeito às diferenças, gentileza para com o próximo e me incutiram o valor do estudo.

2 - AH: O que o levou a cursar História?

RDTN: Essa pergunta é um pouco engraçada, pois a resposta está relacionada a da questão anterior. Quando eu era criança, minha avó comprava semanalmente para mim uma revista infantil cujo brinde era o similar de uma peça de arqueologia acompanhada de um folheto explicativo sobre a cultura a qual o item pertencia. Essa foi a porta de entrada para que eu me aprofundasse mais no assunto. Eu passava horas na biblioteca da escola a procura de livros sobre a Grécia Clássica e o Egito Antigo. Me tornei então um apaixonado pela história, mas não imaginava que pudesse viver disso. Meus professores do Ensino Médio me orientaram bastante na minha escolha profissional e eu percebi que meu trabalho não precisava ficar tão distante daquilo que eu amava. 

3 - AH: Em 2017, você defendeu a sua dissertação. Você pode falar um pouco sobre o que pesquisou no mestrado?

RDTN: Na minha dissertação de mestrado, defendida em 20 de fevereiro de 2017, sob orientação do Prof. Dr. Marcello Moreira, pesquisei a representação dos casamentos arranjados no romance Senhora (1875), de José de Alencar. O autor critica este tipo de matrimônio, comparando-o a uma transação comercial similar à escravidão, na qual a noiva, por meio do dote, compra o noivo que lhe convém. Para tanto, fiz um cruzamento de fontes, como relatos de cronistas estrangeiros e jornais do período com a determinada obra, no intuito de complementar e mesmo contrastar com a opinião do romancista sobre alguns aspectos da aristocracia imperial, especialmente no que concerne à questão da mulher economicamente emancipada. 

4 - AH: A Independência do Brasil foi proclamada há 196 anos atrás, dando início ao período conhecido como Brasil Imperial (1822 - 1889). Qual o legado que o Brasil monárquico nos deixou?

RDTN: Acredito que o maior legado do período imperial tenha sido a manutenção da unidade territorial brasileira, que poderia ter se esfacelado, como ocorreu com as vizinhas colônias espanholas. 

5 - AH: D. Amélia de Leuchtenberg (1812 - 1873) se casou com D. Pedro I (1798 - 1834) depois que este ficou viúvo. Entretanto, ao contrário do que acontece com D. Leopoldina (1797 - 1826), D. Amélia não é muito lembrada. Por que isso acontece?

RDTN: Dona Amélia viveu muito pouco no Brasil, de 1829 a 1831 e, portanto, não teve tempo suficiente para conquistar a devoção dos súditos de Dom Pedro I, como aconteceu com Dona Leopoldina. Além disso, não se envolveu em nenhum projeto político de destaque, ao contrário da primeira imperatriz. Talvez por isso ela não seja tão lembrada por nós, apesar de ter contribuído bastante para reabilitar a imagem do marido, desgastada desde a morte de Leopoldina. 

6 - AH: Nos últimos tempos, os movimentos de restauração monárquica têm crescido consideravelmente no Brasil. Qual a explicação para este fenômeno?

RDTN: Penso que isso se deve ao momento de instabilidade política ao qual nós vivemos. Muitas pessoas procuram saídas para a crise e algumas defendem a bandeira do antigo regime por acreditarem ser esta a solução para os problemas.

7 - AH: O que o levou a criar o blog Rainhas Trágicas?

RDTN: Criei o Rainhas Trágicas como uma forma de compartilhar com o público de leitores interessados as minhas pesquisas para o meu trabalho de conclusão de curso. Com o tempo, fui expandindo o espaço para abarcar outros temas. O número de acessos ao blog foi aumentando e, com eles, as sugestões dos seguidores. 

8 - AH: O seu livro intitulado Rainhas Trágicas: quinze mulheres que moldaram o destino da Europa (2016) foi publicado em Portugal. O que o levou a fazer isso? É muito difícil lançar livro no Brasil?

RDTN: A ideia de publicar um livro era algo que só ocorria uma vez terminada minha formação acadêmica. A proposta veio um pouco mais cedo, através do Guilherme Pires, que na época era editor na Vogais Editora, de Portugal. Trabalhei então no material publicado no blog, reescrevendo-o e compondo um material inédito para a publicação. Assim nasceu o Rainhas Trágicas: quinze mulheres que moldaram o destino da Europa (2016). 

9 - AH: Você já pesquisou e ainda pesquisa sobre diversas monarcas de diferentes épocas e lugares. Há uma que você considera a sua preferida e/ou que lhe serve de inspiração?

RDTN: Sem dúvidas, Ana Bolena (c. 1501/1507 - 1536) continua sendo a minha preferida. Foi ela a porta de entrada para que eu conhecesse a vida de outras soberanas trágicas, tais como Maria Antonieta (1755 - 1793) e Dona Leopoldina. 

10 - AH: Em 2018 faz 100 anos que a família Romanov, cuja integrante mais conhecida é Anastácia Nikolaevna (1901 - 1918), foi executada. Por conta deste fato, muitos textos têm sido publicados na internet sobre a família em questão e a Netflix anunciou em 2017 que vai fazer uma série documental sobre a família Romanov. Este interesse por tal família é algo que sempre esteve presente na sociedade ou só faz parte da lembrança dos 100 anos do brutal assassinato?

RDTN: Penso que esse crescente interesse se deva principalmente ao centenário do assassinato da família. Em 1918, eles não eram muito queridos na Rússia e não houve comoção popular ante a notícia da morte da família em questão. Em seguida, surgiram os impostores e então os Romanov voltaram a ser machete, especialmente o caso de Anna Anderson (1896 - 1984), que chegou a mover um processo judicial para ser reconhecida como Anastácia Nikolaevna. Essa afirmação caiu por terra quando os remanescentes humanos das vítimas de Ecatimburgo foram revelados, após a queda da União Soviética (URSS), em 1991. Muitos documentos relativos ao assassinato da família imperial, antes mantido sob sigilo, foram divulgados, oferecendo assim mais luz sob o que aconteceu na casa Ipatiev naquela madrugada de 17 de julho de 1918. 

11 - AH: No continente africano e também no Oriente Médio há regiões que são governadas por dinastias. Entretanto, eu nunca vi (pode ser que exista) um texto em seu blog sobre tais monarquias. As dinastias da África e do Oriente Médio não são o foco das suas pesquisas?

RDTN: Tenho começado a pesquisar mais sobre outras dinastias agora, como parte desse processo de expansão do escopo de temas publicados no Rainhas Trágicas. Tenho muito interesse por figuras como Cleópatra VII (69 a. C. - 30 a. C.) e a rainha Ginga (1583 - 1663). Pretendo escrever matérias sobre elas ainda este ano. 

12 - AH: Renato, foi um prazer muito grande entrevistar você e agradeço o carinho e a atenção com que você me tratou desde a primeira vez em que eu entrei em contato com você. Agora, para fechar esta entrevista maravilhosa, você pode deixar uma mensagem para os leitores do blog A Hora?

RDTN: Eu que agradeço pelo interesse e pela consideração. Aos leitores do blog A Hora que estiverem lendo essa entrevista, agradeço pela paciência e os convido a conhecer o Rainhas Trágicas. Suas opiniões serão muito bem vindas. Um abraço! 

Um comentário:

  1. Aqui de Portugal, professor de História aposentado, sou um admirador antigo. Desde cedo que os textos do Renato têm grande qualidade.
    João Mendes Pinto

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